Pensar sobre o certo e o errado é algo que já me ocupou por um bom tempo. Antigamente as pessoas em geral não tinham maior necessidade de pensar sobre isso, afinal, o certo e o errado já estavam dados. Mas na época relativista em que vivemos, é difícil escapar da reflexão sobre a ética.
No entanto, uma coisa é o que pensamos ser ético de forma racional. Outra coisa são nossos verdadeiros sentimentos que temos guardados dentro de nós. É na tensão entre razão e emoção que, às vezes, um dos lados do conflito quer convencer o outro a ficar quieto. Quando um vence o outro é que vem a ação (ou a falta de ação) – às vezes vemos que cometemos um grande equívoco ao deixar o sentimento vencer sobre a razão; outras vezes arrependemo-nos amargamente de termos seguido nossa razão moralista que só era uma desculpa para a covardia.
Criado dentro de uma moralidade evangélica, cumprir as leis consideradas corretas pelo que eu entendia ser cristão era uma busca eterna. Algumas coisas eram bobagens sem qualquer fundamentação bíblica, teológica, prática ou racional. Essas rapidamente joguei fora. Mas ainda havia aquelas regras que conservei, que considerava válidas. Para essas, acreditava que todos os esforços deveriam ser feitos para que fossem cumpridas, sejam eles humanos ou sobre-humanos. Foi preciso carregar muita culpa para ver a impossibilidade de tal cumprimento pleno.
Seguindo os ensinamentos de Jesus, sempre considerei a vingança ou o sentimento vingativo algo errado. O que eu fazia era simplesmente suprimir o ódio e o desejo de vingança, engolindo seco, fingindo que estava tudo bem e enganando a mim mesmo. Lembro de um episódio em particular em relação a uma pessoa. Engoli seco a dor e a raiva, acreditei que estivesse tudo bem. Mas não consegui, após alguns anos, deixar de me flagrar fazendo piadas sarcásticas, dar alfinetadas e tudo o mais para atingir essa pessoa. Eu simplesmente não tinha superado aquele transtorno. É até curioso ver como a cura não provém de nosso esforço. Eu bem que tentei com as minhas próprias forças.
Sempre considerei errado tentar ficar com alguma guria compromissada (considerando namoro, quem dirá casamento). Para Jesus, o simples desejo por mulher de outrem já era pecado. Concordo, uma vez que, se desejamos a mulher de nosso próximo, não estamos nos colocando no lugar dele de acordo com o mandamento divino maior de amar o próximo. Mas os humanos são e não deixarão de ser humanos. Certa vez não pude evitar o surgimento de um forte interesse por uma menina que tinha namorado. Poderia negar e esconder os sentimentos, mas isso não me tornaria menos pecador. A situação me deixou em conflito: o que fazer? Afinal, o interesse surgiu e, portanto, o problema já existia. Num domingo, orei durante o culto para que Deus não me abandonasse no conflito ético. Estranhamente, ao conversar casualmente com a menina, a conversa chegou a tal ponto que não pude mais esconder meus sentimentos. E agora? Ir adiante ou não? Novo conflito ético se colocou.
Nessas horas, simplesmente devemos recorrer a Deus ao invés de simplesmente reprimir todo sentimento que acreditamos contrariar a ética cristã. É na oração que podemos tentar enxergar as coisas com os olhos amorosos de Deus. Por nossos próprios esforços, nunca deixaremos de pecar. E Deus compreendeu isso ao enviar seu Filho, que se tornou humano, permitindo que nós também fôssemos simplesmente humanos. Cristãos não são seres superiores ou menos pecadores (só se for farisaicamente), são pessoas que vivem da graça redentora de Deus, que sempre nos perdoa e nos ajuda a colocar sinais de seu Reino nesse mundo. É por ela que devemos esperar para que os erros não destruam nossa vida.
O teólogo e mártir Dietrich Bonhoeffer diz que Deus jamais nos deixa em um conflito ético insolúvel. Devemos, portanto, esperar a resposta dele. É isso que estou sempre esperando...